Mudanças radicais na legislação não afastam investimentos
No fim das contas, os abundantes recursos minerais do subsolo sul-africano falaram mais alto – e compensam os riscos
Voltar para o índice
Trabalhadores na mina subterrânea da Harmony Gold perto de Johannesburg, na África do Sul Troca das concessões minerais antigas por novas, emitidas pelo governo eleito pela maioria da população negra da África do Sul, condicionada a programas de potencialização (enpowerment, em inglês) econômica da população prejudicada historicamente pelo regime de apartheid, destinando a investidores negros 15% do capital das mineradoras até 2009, e outros 14% até 2014, como condição obrigatória de renovação das concessões. Cobranças de royalties sobre a produção mineral, que inexistiam no regime anterior. Destinação compulsória de parte da produção de pedras brutas de diamantes para polimento local, a despeito da mão-de-obra mais cara. E agora, a possibilidade de uma nova taxação sobre os lucros extraordinários das mineradoras com as altas recentes de preços. Tudo isso está acontecendo na África do Sul e os organismos de comércio internacional não registraram nenhuma queda significativa dos investimentos diretos estrangeiros no país com relação à média histórica, embora essa média seja considerada relativamente baixa para as necessidades de desenvolvimento da economia local. Como se explica esse aparente paradoxo? Basta olhar para a base de recursos minerais estimados da África do Sul. Mas nem tudo é céu de brigadeiro na África do Sul. Três mineradoras de granito italianas entraram com ação contra o governo, reivindicando indenização de US$ 349 milhões, por prejuízos causados pela nova legislação mineral que “infringiria dispositivos de tratados internacionais”. Esta ação está sendo julgada por um organismo de arbitragem mundial. Esta legislação foi introduzida em maio de 2004 e o governo sul-africano adiou recentemente a data limite para 2009 para que mineradoras que se considerem prejudicadas possam entrar com ações contra o processo de renovação dos direitos minerários. Esse cenário de altos riscos foi visto, entretanto, como uma oportunidade rara pelo empresário sul-africano Adam Fleming, fundador e presidente da Witwatersrand Consolidated Gold Resources, que no momento busca listar suas ações numa bolsa da América do Norte. Wits Gold – como é mais conhecida – é uma empresa singular por seu conceito de negócio e pelo tamanho extraordinário de seus recursos minerais – 160 milhões de onças de ouro e 164 milhões de libras de urânio! Seria uma das dez maiores bases de recursos em ouro. Mas seu valor de capitalização na bolsa de Johannesburgo é modesto — US$ 300 milhões, refletindo a dúvida do mercado sobre a viabilidade técnica de explotação dessas reservas de ouro localizadas a profundidades excepcionais. As reservas estão todas na categoria inferida e embora uma boa parte delas esteja na faixa de profundidade de 2.500 m – considerada normal pela mineração de ouro no país – o restante está a 5 mil m de profundidade na Bacia de Witwatersrand, cuja extração, embora tecnicamente exeqüível, importa em custos muito elevados. Isto significa que a empresa só é viável se os preços atuais do ouro se mantiverem ascendentes. E a política sul-africana teve participação decisiva no nascimento da empresa. Alguns anos atrás, começaram a tomar forma as medidas que hoje são conhecidas como política de potencialização econômica do negro. A legislação minera foi alterada, as mineradoras tiveram que devolver os direitos minerários que possuíam ao governo, podendo readquiri-los sob a condição de cumprir algumas regras novas. Uma delas tem o apelido de “use-o ou deixe-o”, pelo qual uma empresa precisa realizar exploração ativamente ou iniciar a lavra num determinado período de anos. A outra estabelece que até 2014 pelo menos 26% dos acionistas de uma empresa precisam pertencer a grupos étnicos. Nesta época, Fleming era presidente da Harmony Gold na África do Sul e sabia que grandes mineradoras, como sua própria empresa, Gold Fields e AngloGold, tinham recursos de ouro fora de suas áreas de mineração na Bacia de Witwatersrand, que estavam longe de ser economicamente viáveis. O metal estava a US$ 350/onça e não havia incentivo financeiro para desenvolver estes depósitos — de modo que as grandes mineradoras não tinham como reter essas propriedades dentro da nova legislação. Fleming foi membro dos negócios bancários da família, era conhecido tanto em Londres como na África do Sul, onde abriu escritório em 1991. Tornou-se acionista principal da West Rand Consolidated Mines e Kalahari Goldridge Mining, que se fundiram depois com a Harmony, da qual veio a ser presidente. Em 2003, começou a procurar umgeólogo com conhecimentos profundos de Witwatersrand e que pudesse selecionar as propriedades para aquisição na região. Por pura sorte, chegou a Marc Watchorn, um geólogo que dedicou cinco anos da sua carreira em Witwatersrand para ganhar os títulos de mestre e doutor em ciências. Fleming estruturou linhas de financiamento e parceiros engajados na política de potencialização econômica do negro – as empresas Continental África Gold Resources e a Tranter Kismet - e juntos fundaram a Fundação Wits Gold Women. Estas empresas controlam 40% da empresa, Fleming 10% e os outros diretores 8%. Depois de estudar durante três meses dados geológicos disponíveis no mercado, Watchorn identificou 15 áreas de interesse. Fleming então demitiu-se da Harmony, formou a Wits Gold e fez uma proposta à sua antiga empresa, além da Golds Fields e AngloGold. Em 2004, eles adquiriram os direitos antigos dessas mineradoras sobre a região de Potchefstroom e o sul do Free State, gastando cerca de 15 milhões de rands reunidos pelos diretores fundadores. Uma cláusula crucial para que essas mineradoras entrassem no negócio foi a garantia de que 40% da produção de ouro lhes pertencem caso um depósito chegue à fase de mineração. Wits Gold compilou os dados históricos de exploração geológica que vieram juntos com as propriedades e formatou uma base digital de dados. Contratou a consultora australiana Snowden para formular uma estimativa independente de recursos, que ficou pronta no final de 2005. Wits Gold tinha uma estimativa de recursos de 142 milhões de onças. Em abril de 2006 a empresa, com o relatório da Snowden, lançou suasações na bolsa de Johannesburgo e levantou 32 milhões de rands, além de outros 30 milhões de rands numa colocação privada. Wits Gold prevê investir cerca de R$ 40 milhões em exploração nos próximos quatro anos, para alavancar pelo menos um projeto ao estágio de pré-viabilidade, entre os alvos prioritários na Bacia de Witwatersrand na faixa de 500 m a 2500 m de profundidade. Nessa faixa, estão 45 milhões de onças de recursos da empresa, que podem ser acessados com um único poço – que custaria 3 bilhões de rands para atingir 2500 m! O geólogo Watchorn acredita que o ouro atingirá US$ 1000 muito antes do que muitos pensam. Uma vez estabelecido um recurs indicado de 10 milhões de onças, Wits Gold vai recorrer a uma das mineradoras major para o projeto de mineração. Nesse meio tempo, a empresa vai listar suas ações numa bolsa da América do Norte, talvez no Canadá, onde segundo o geólogo, “os investidores entendem de exploração mineral, ao contrário da África do Sul, onde a comunidade de investidores é pequena e conservadora.”
Confira a Produção mineral na África do Sul em 2005
Nenhum comentário:
Postar um comentário